Confissões de um sedutor: entre a moralidade e a necessidade
Confissões de um sedutor (The man from Elysian Fields, 2001) é um daqueles filmes independentes despretensiosos que nos encantam pelo roteiro e atuações de um elenco bem escolhido. Produzido e protagonizado por Andy Garcia o filme é narrado pelo personagem Luther Fox interpretado por ninguém menos que Mick Jagger, que por sinal surpreende o espectador com uma atuação equilibrada e comedida em nada lembrando suas performances inquietas nos shows do Rolling Stones.
O personagem de Mick conduz o espectador ao percurso da vida do escritor Byron Tiller (Andy Garcia), o qual após o fracasso na venda de seus últimos livros se vê diante de uma situação de escassez financeira e desemprego, fato este que o angustia por ser um pai de família e marido devotado.
Em meio a essa fase de penúria o misterioso e elegante Luther (Jagger) cruza o caminho do escritor e o propõe uma oferta de emprego que colocará sua dignidade à prova: acompanhar mulheres ricas em eventos e se preciso até a cama. Constrangido e recusando a princípio a proposta, Byron (Garcia) decide, após muita resistência, aceitar o ‘emprego’ para tentar oferecer uma vida melhor a sua esposa e filho.
Em uma espécie de jornada fáustica Byron sente-se culpado por omitir da esposa a razão de suas saídas noturnas ao mesmo tempo em que enxerga a possibilidade de mudança quando o marido de sua cliente fixa propõe ao escritor que o auxilie na escrita de um livro prometendo em troca a divisão dos lucros da venda além da co-autoria. Empolgado, Byron empenha-se e em meio aos encontros com a cliente (Olivia Williams) e as reuniões com seu marido, um famoso escritor (James Coburn), vê renascer sua criatividade.
Contudo, após a morte do famoso escritor a viúva-cliente não cumpre o acordo e lança o livro com autoria única de seu falecido marido. Decepcionado, Byron a abandona, apesar de ainda continuar a trabalhar como acompanhante da agência Campos Elíseos.
Para piorar a situação do acompanhante-escritor sua esposa (Julianna Margulies) descobre tudo e decide divorciar-se. Sozinho e sem dignidade Byron decide sair da agência e encontra um emprego de garçom no restaurante de um amigo.
Um dos fatores de Confissões de um sedutor ser um excelente filme são as questões que levanta diante do comportamento de seu protagonista que se envolve em uma complexa situação nos levando a questionar: até que ponto o ser humano é capaz de abdicar a seus valores e ética para suprir suas necessidades? Qual seria o limite que separa moralidade e necessidade?
Como em uma fábula moral o filme não nos oferece uma resposta ou um sermão forçado sobre as escolhas do personagem central, mas por intermédio de seus personagens secundários como o de Luther e o de Nigel (Michael Des Barres) outro acompanhante da agência, nos mostra o lado humano e difícil desta ‘profissão’, na qual apesar de oferecem prazer a inúmeras mulheres estes homens sentem-se frustrados e usados e como ressalta o personagem Nigel recorrem a esse ramo de atuação quando se sentem totalmente impotentes diante da vida.
Mick Jagger: o roqueiro que virou ator
Pode-se dizer que a grande surpresa de Confissões de um sedutor é a interpretação de Mick Jagger que consegue construir um personagem instigante ao qual no decorrer do filme ele vai adicionando nuances que contribuem para a transformação gradual do personagem.
Em sua primeira cena no papel do agenciador de acompanhantes da empresa Campos Elíseos, Jagger nos apresenta um personagem enigmático por trás de uma elegância impecável.
Aos poucos, a cada cena o personagem, a princípio prático e realista, vai modificando-se à medida que Jagger imprime certa humanidade a suas ações e o sentimentalismo antes velado devido ao seu ofício aflora-se quando seu personagem totalmente vulnerável declara-se para sua cliente fixa, a mais de dez anos, interpretada pela excêntrica Anjelica Houston, recusa e escarnece da proposta de casamento feita por Luther (Jagger), o qual decepcionado passa a repensar se permanecerá ou não na profissão.
Motivado pela saga de Byron (Garcia) em busca da recuperação de sua dignidade, Luther (Jagger) ao final mostra-se um homem com aspirações comuns e como ele mesmo ressalta: alguém que cansou de dar prazer a muitas mulheres e deseja satisfazer apenas uma e com ela constituir família.
A realidade não é poética!
Confissões de um sedutor é um filme que nos faz indagar sobre as conseqüências de nossas escolhas e sobre até que ponto nossa necessidade deve falar mais alto que nossos princípios éticos.
Referências
Confissões de um sedutor (The man from Elysian Fields). Dir: George Hickenlooper, 105min, 2001